A tendência demográfica aponta para um aumento exponencial da média de idades da população, em que a população idosa passará a ter uma importante representatividade na sociedade (Instituto Nacional de Estatística, 2022). Com o envelhecimento populacional aumenta a prevalência dos distúrbios neurocognitivos major (DNM) na população com mais de 65 anos (Gonçalves-Pereira, 2017). Os profissionais de saúde evidenciam elevados níveis de insatisfação, traduzindo-se em burnout, rotatividade e abandono da profissão, pelo que deve haver uma preocupação pela redução dos desafios experienciados durante o exercício profissional (Kuzuya, 2019). Alguns dos maiores desafios reportados pelos cuidadores formais e informais estão associados ao cuidado de pessoas idosas com alterações cognitivas, principalmente a gestão de sintomas neuropsiquiátricos (SNP). Em contexto de cuidado hospitalar ou de longa duração à pessoa idosa com alterações cognitivas a prevalência de SNP's chega a 96% (Kim, Noh & Kim, 2021). Esta elevada prevalência contribui para a recusa de cuidado desta população, que chega a uma frequência de 54% (Choi, Cajita & Gitlin, 2020). O conceito de recusa de cuidado é entendido como a presença de comportamentos de não-adesão ou resistência por parte de pessoas com alterações cognitivas, em resposta à forma como são prestados os cuidados, criando ciclos de stress para todos os envolvidos, constituindo um obstáculo à efetividade do cuidado e ao bem-estar da pessoa cuidada e do cuidador (Featherstone, 2019).A Metodologia de Cuidado Humanitude (MCH) tem por base uma filosofia de cuidado centrada na interação entre cuidador e a pessoa cuidada e é constituída por técnicas e procedimentos relacionais encadeados e sistematizados que permitem a operacionalização da relação na práxis, preservando a Humanitude da pessoa (Henriques et al., 2020). Esta metodologia constitui uma importante ferramenta para a enfermagem, facilitando a interação com a pessoa cuidada e o estabelecimento de uma relação terapêutica (Hesbeen, 2006; Phaneuf, 2010; Melo et al., 2019; Henriques et al., 2020). A MCH pela sistematização de técnicas profissionalizantes da relação demonstra ganhos em saúde, sendo por isso relevante a investigação do seu impacto na efetividade do cuidado de enfermagem (Melo et al., 2019; Seiffert et al., 2020).A efetividade do cuidado pressupõe o envolvimento da pessoa cuidada, no pleno exercício da sua autonomia, por isso a recusa de cuidado pelas pessoas idosas com alterações cognitivas compromete a efetividade do cuidado (Konno, Kang & Makimoto, 2014, Featherstone, 2019; Seiffert et al., 2020). Ainda assim, os estudos sobre estratégias para a gestão da recusa de cuidado e promoção da aceitação do cuidado, nestes contextos, são escassos (Backhouse et al., 2020; Giang et al., 2021).A solução dominante em Portugal de cuidados de longa duração para pessoas idosas são as Estruturas Residenciais para Pessoas Idosas (ERPI). É necessário (re)configurar o cuidado nestas estruturas, no sentido de se oferecer um cuidado adequado, proporcionando bem-estar a estas pessoas idosas (Crispim, 2021). Alguns estudos têm demonstrado que a implementação da Metodologia de Cuidado Humanitude promoveu o cuidado relacional profissionalizado e intencional, o respeito pela dignidade da pessoa cuidada e do cuidador, contribuindo para o bem-estar e acrescentando ganhos em saúde (Melo et al., 2019; Henriques et al., 2020). No entanto não foram encontrados estudos sobre o contributo da MCH, quando a implementação é liderada pela enfermagem, na gestão da recusa de cuidado por pessoas com alterações cognitivas, neste contexto (Backhouse et al., 2020; Giang et al., 2021).
Os cuidadores formais de pessoas idosas com alterações cognitivas enfrentam desafios significativos na gestão da recusa de cuidado. A Metodologia de Cuidado Humanitude (MCH), baseada nos pilares do olhar, palavra, toque e verticalidade, oferece uma abordagem sistemática para melhorar a interação cuidador-pessoa cuidada. O objetivo é identificar os contributos da MCH na gestão da recusa do cuidado pela pessoa idosa com alterações cognitivas institucionalizada, na perspetiva dos cuidadores formais em Estruturas Residenciais para Pessoas Idosas (ERPI).A implementação da MCH ocorrerá em três ERPI, liderada por enfermeiros e em colaboração com o Instituto Gineste Marescotti. Utilizando métodos mistos, os dados serão coletados em três momentos: antes, durante e após a implementação. O projeto inclui validação de escalas para população portuguesa, formação dos cuidadores e monitorização das mudanças práticas. Espera-se que a implementação da MCH resulte em maior aceitação do cuidado pelas pessoas com alterações cognitivas e na elaboração de guidelines de boas práticas para cuidadores formais, contribuindo para a efetividade do cuidado de enfermagem.
Objetivo geral:Identificar o contributo do cuidado em Humanitude na gestão da recusa do cuidado pela pessoa idosa com alterações cognitivas, na perspetiva do cuidador formal em contexto de ERPI.
Objetivos operacionais:Mapear a evidência publicada sobre a recusa de cuidado pelas pessoas idosas com alterações cognitivas;Adaptar e validar para a população portuguesa a escala "Refusal of Care Informant Scale" (RoCIS);Implementar a Metodologia de Cuidado Humanitude (MCH) em pelo menos três ERPI;Produzir orientações práticas (guideline de boas práticas) para cuidadores formais para a promoção da aceitação do cuidado pela pessoa idosa com alterações cognitivas, para que estas se reflitam em práticas que promovam a efetividade dos cuidados de enfermagem.
Questão de Pesquisa:Qual o contributo do cuidado Humanitude, na perspetiva do cuidador formal, na gestão da recusa do cuidado pela pessoa idosa com alterações cognitivas a viver em ERPI?
Com o envelhecimento populacional investigações na área da enfermagem geriátrica são um imperativo. A implementação da Metodologia de Cuidado Humanitude (MCH) tem-se demonstrado eficaz, mas não são conhecidos estudos sobre o seu contributo na gestão da recusa do cuidado pelas pessoas idosas com perdas cognitivas. Atendendo ao aumento desta população e a importância desta temática, esta investigação tem um caracter inovador único, com um potencial de repercussão internacional em boas práticas de cuidado.Com esta investigação espera-se:Compreender melhor o fenómeno da recusa do cuidado pelas pessoas idosas com perdas cognitivasAdaptar e validar uma escala para a avaliação da recusa do cuidado para a população portuguesaVerificar o impacto da implementação da MCH em ERPIIdentificar o contributo do cuidado Humanitude na gestão da recusa do cuidado pelas pessoas idosas com alterações cognitivasIdentificar o contributo da enfermagem para a gestão de cuidados e liderança de processos de mudança e inovação em ERPIElaborar orientações práticas (guideline de boas práticas) para cuidadores formais facilitadoras da interação com estas pessoasEsta investigação poderá contribuir para uma sociedade cada vez mais envelhecida e profissionais de saúde cada vez mais desmotivados para cuidar desta população com esta problemática. O estudo pode contribuir para a valorização do cuidado à população idosa com alterações cognitivas e dos seus cuidadores formais, melhorando a qualidade dos cuidados prestados.
Os cidadãos serão colaboradores e coprodutores, considerando que irá haver cidadãos que serão envolvidos na colheita de dados, e cidadãos que estarão envolvidos na fase de implementação participando na direção e gestão da investigação.Este envolvimento segue as diferentes abordagens para operacionalizar o Envolvimento do cidadão:Abordagem Consultiva:Reuniões de grupos ou núcleos consultivos de cidadãos; Abordagem interativa e sistemática; Obtenção de opiniões através de painéis de cidadãos (utentes, pessoas sem comorbilidades, cuidadores ou end-users)Abordagem Colaborativa:Estabelecimento de parceriasEleição de "coinvestigadores" ou "parceiros na investigação"Compartilhamento da tomada de decisão com os investigadores através do envolvimento na:Elaboração dos consentimentos informadosColheita de dadosReuniões de follow up do processoFase de disseminação (ex: realização de workshops)Abordagem de Coprodução:Cidadãos exercem ativamente papel como membros da equipa de investigaçãoParticipação no controle, direção e gestão da investigaçãoMesmo nível de decisão que os investigadores nas fases de realização do projetoO envolvimento do cidadão acrescenta qualidade e relevância à investigação produzida e à Tomada de Decisão por parte da equipa de investigação.
Backhouse, T., Dudzinski, E., Killett, A., & Mioshi, E. (2020). Strategies and interventions to reduce or manage refusals in personal care in dementia: A systematic review. International journal of nursing studies. 109. 103640. https://doi.org/10.1016/j.ijnurstu.2020.103640
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08/11/2023
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Implementation of the Humanitude care methodology
Self-care and health-disease