A doença de Parkinson é uma doença neurodegenerativa comum, progressiva e heterogénea (Balestrino & Schapira, 2020; World Health Organization, 2022). Relativamente à sua etiologia, identificam-se fatores genéticos, ambientais e relacionados com o processo de envelhecimento (Balestrino & Schapira, 2020; Reich & Savitt, 2019).
A prevalência estimada da doença é de 0,3% na população mundial (World Health Organization, 2022). Na Europa, as taxas de incidência e prevalência estimadas para a doença variam entre 5 e 346 por 100000 pessoas e entre 257 e 1400 por 100000 pessoas, por ano, respetivamente (Balestrino & Schapira, 2020). Em Portugal, um estudo transversal calculou a prevalência da doença em 180 por 100000 habitantes (Ferreira et al., 2017).
A doença de Parkinson causa sintomas motores e não motores. O tremor, a rigidez, a bradicinesia e a instabilidade postural são os quatro sintomas motores que a caracterizam (Jin et al., 2019; Claus et al., 2021). Adicionalmente, surge, com frequência, um conjunto de sintomas associados à disfunção respiratória tais como: dispneia, taquipneia, hipofonação, sialorreia, compromisso dos processos de deglutição e do mecanismo de tosse eficaz (Claus et al., 2021; McMahon et al., 2020).
Estes sintomas têm impacto nos resultados em saúde, nomeadamente devido a complicações como infeções respiratórias ou pneumonias de aspiração, responsáveis pela morbilidade e mortalidade na doença de Parkinson (Baille et al, 2016; Oguz et al, 2022), assim como na satisfação do autocuidado, da qualidade de vida e do bem-estar das pessoas com doença de Parkinson (Claus et al., 2021; Dongen et al., 2022).
Compreende-se também que o início ou agravamento da sintomatologia de disfunção respiratória configura uma transição de saúde-doença em pessoas com doença de Parkinson, sendo desejável que todo o processo de transição culmine com o desenvolvimento de competências adaptativas e a incorporação de novos conhecimentos, possibilitando a mudança comportamental (Meleis et al., 2000).
Face a estas considerações, é premente o desenvolvimento e a implementação de estratégias, com o objetivo de se mitigar o efeito desta sintomatologia na vida das pessoas com doença de Parkinson. Uma das opções poderá passar pela promoção da autogestão (Fabbri et al., 2020).
A autogestão é um processo dinâmico e contínuo de autorregulação, intrínseco ao autocuidado de pessoas que vivem com uma condição de saúde crónica, centrando-se em promover a capacidade das pessoas para gerirem os sintomas, o tratamento e as consequências físicas, emocionais e sociais da doença (Lorig & Holman, 2003; McGowan, 2012).
Este processo pode ser ancorado na Teoria do Autocuidado de Doenças Crónicas, que assume como premissa identificar e documentar as ações e estratégias que são necessárias de serem realizadas pelas pessoas, quando estas têm um diagnóstico de doença crónica (Riegel et al., 2012). Esta teoria integra os conceitos de manutenção, monitorização e gestão do autocuidado, que objetivam respetivamente promover a saúde e prevenir o agravamento dos sintomas, reconhecer quaisquer mudanças que ocorram associadas à condição de saúde, e controlar os sintomas para garantir o bem-estar e a qualidade de vida (Riegel et al., 2012).
Têm sido descritos na literatura um conjunto de programas de autogestão para pessoas com doença de Parkinson (Hellqvist et al., 2018; Lyons et al., 2021). Estes programas de autogestão têm sido direcionados à qualidade de vida e ao bem-estar, aos sintomas motores e à sintomatologia depressiva (Milne-Ives et al., 2022; Pigott et al., 2022), sem contemplarem a capacitação das pessoas para a autogestão dos sintomas de disfunção respiratória.
Neste âmbito, urge a necessidade de programas de autogestão que sejam dirigidos especificamente a estes sintomas, pelo que este projeto propõe desenvolver um programa de autogestão de sintomas de disfunção respiratória para pessoas com doença de Parkinson.
A doença de Parkinson é uma doença neurodegenerativa comum, progressiva e heterogénea, representando um desafio no cuidado transicional às pessoas com a doença e suas famílias.
Com a natural progressão da doença, assim como com o compromisso da função muscular respiratória, da rigidez da parede torácica e da instabilidade postural, associados à mesma, pode surgir um conjunto de sintomas de disfunção respiratória, que têm profundo impacto nos resultados de saúde da pessoa, como é exemplo, o autocuidado e o bem-estar.
Preconiza-se que as pessoas com doença de Parkinson assumam um papel ativo no seu processo de saúde-doença. A promoção da autogestão dos sintomas de disfunção respiratória pode constituir-se uma estratégia fundamental, para mitigar os efeitos dos mesmos na vida da pessoa com doença de Parkinson. A evidência produzida sobre este tema é escassa.
O objetivo principal deste projeto é: i) desenvolver e avaliar a viabilidade de um programa de autogestão de sintomas de disfunção respiratória em pessoas com doença de Parkinson. Recorrendo à metodologia das intervenções complexas, do Medical Research Council, o projeto compreende duas fases: i) Desenvolvimento da Intervenção; e ii) Viabilidade.
Objetivo geral: Desenvolver e avaliar a viabilidade de um programa de autogestão de sintomas de disfunção respiratória para pessoas com doença de Parkinson.
Objetivos específicos deste projeto:
1 - Mapear os programas de Reabilitação Respiratória implementados em pessoas com doença de Parkinson;
2 - Conhecer e explorar a perspetiva de pessoas com doença de Parkinson sobre o impacto dos sintomas de disfunção respiratória na sua vida, e sobre as suas necessidades e estratégias de autogestão;
3 - Conhecer e explorar a perspetiva de cuidadores informais sobre o impacto dos sintomas de disfunção respiratória na vida das pessoas com doença de Parkinson, e sobre as suas necessidades e estratégias de autogestão;
4 - Conhecer e explorar a perspetiva de profissionais de saúde sobre o impacto dos sintomas de disfunção respiratória na vida das pessoas com doença de Parkinson, e sobre as suas necessidades e estratégias de autogestão;
5 - Desenvolver um programa de autogestão de sintomas de disfunção respiratória para pessoas com doença de Parkinson;
6 - Avaliar a viabilidade do programa de autogestão de sintomas de disfunção respiratória para pessoas com doença de Parkinson.
Com recurso à metodologia das intervenções complexas, do Medical Research Council (Skivington et al., 2021), o projeto compreende duas fases: i) Desenvolvimento da Intervenção; e ii) Viabilidade.
A presente investigação irá contribuir para o desenvolvimento do corpo de conhecimentos de Enfermagem existente na comunidade científica, e concretamente no domínio da Reabilitação em pessoas com doença de Parkinson.
O carácter inovador desta proposta reside na possibilidade de se desenvolver e avaliar a viabilidade de um programa de autogestão de sintomas de disfunção respiratória, que permita à comunidade académica e à prática clínica reconhecê-lo como útil e benéfico para pessoas com doença de Parkinson.
Adicionalmente, vislumbra-se do seu design metodológico o envolvimento do cidadão nos processos de Investigação. Algo que lhe confere uma maior sensibilidade social, e alinhado com a premissa de tornar a ciência útil, acessível e significativa, firmando o propósito da Investigação e da Ciência, que é a sua devolução à sociedade.
Sustentado no reconhecimento da transição de saúde-doença e da importância da autogestão da sintomatologia descrita, destaca-se assim a pertinência deste projeto, pela sua enorme relevância, e enquadrado na promoção da autonomia individual da pessoa com doença de Parkinson.
Ao longo do percurso de Doutoramento, serão respeitados todos os princípios éticos e deontológicos a seguir na investigação científica. Paralelamente, irão ser submetidos dois pedidos de apreciação à Comissão de Ética da Unidade de Investigação em Ciências da Saúde: Enfermagem (UICISA: E), da Escola Superior de Enfermagem de Coimbra, para a realização das tarefas 2 e 3.
No sentido de operacionalizar o Envolvimento do Cidadão nos processos de Investigação, este projeto de doutoramento irá ao encontro de duas abordagens, em etapas específicas do seu desenvolvimento:
Abordagem consultiva - ponto 2.1: a realização de sessões de grupo focal com pessoas com doença de Parkinson, cuidadores informais de pessoas com doença de Parkinson e profissionais de saúde, respetivamente;
Abordagem colaborativa - ponto 2.2: o guião para cada grupo focal (Krueger & Casey, 2009) será realizado com a colaboração de uma pessoa com doença de Parkinson ou familiar ou cuidador informal, seguindo-se os pressupostos da Ciência Cidadã (Mahr et al., 2018); ponto 3.2: o questionário será desenvolvido com a colaboração de uma pessoa com doença de Parkinson ou familiar ou cuidador informal (Mahr et al., 2018); ponto 3.3: no estudo de índole qualitativo, descritivo, recorrendo a entrevistas semi-estruturadas (Polit & Beck, 2020), será realizado um guião de entrevista, com a colaboração de uma pessoa com doença de Parkinson ou familiar ou cuidador informal (Mahr et al., 2018).
Baille, G., De Jesus, A. M., Perez, T., Devos, D., Dujardin, K., Charley, C. M., Defebvre, L., & Moreau, C. (2016). Ventilatory Dysfunction in Parkinson's Disease. Journal of Parkinson's disease, 6(3), 463–471. https://doi.org/10.3233/JPD-160804.
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Claus, I., Muhle, P., Czechowski, J., Ahring, S., Labeit, B., Suntrup-Krueger, S., Wiendl, H., Dziewas, R., & Warnecke, T. (2021). Expiratory Muscle Strength Training for Therapy of Pharyngeal Dysphagia in Parkinson's Disease. Movement disorders: official journal of the Movement Disorder Society, 36(8), 1815–1824. https://doi.org/10.1002/mds.28552.
Dongen, V. A., Nijkrake, M. J., Koenders, N., van der Wees, P. J., Bloem, B. R., & Kalf, J. G. (2022). Experienced Respiratory Symptoms and the Impact on Daily Life from the Perspective of People with Parkinson's Disease: A Grounded Theory. Journal of Parkinson's disease, 12(5), 1677–1691. https://doi.org/10.3233/JPD-213121.
Fabbri, M., Caldas, A. C., Ramos, J. B., Sanchez-Ferro, Á., Antonini, A., Růžička, E., Lynch, T., Rascol, O., Grimes, D., Eggers, C., Mestre, T. A., & Ferreira, J. J. (2020). Moving towards home-based community-centred integrated care in Parkinson's disease. Parkinsonism & related disorders, 78, 21–26. https://doi.org/10.1016/j.parkreldis.2020.07.001.
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