Clareza e acessibilidade das comunicações em saúde na perspetiva da Ciência Cidadã: elaboração de um instrumento de medida

O envolvimento do cidadão na investigação científica e a Ciência Cidadã (CC) têm ganho relevância, especialmente na área da saúde, onde a comunicação clara e acessível é fundamental para promover a literacia científica e em saúde, capacitar os cidadãos a tomar decisões informadas e fomentar comportamentos saudáveis (Silva et al., 2021). A Organização Mundial da Saúde (OMS) tem vindo, há anos, a promover a participação cidadã em políticas baseadas na evidência, impulsionando projetos “com” ou “pelo” o público, em vez de “sobre” ou “para” (OMS, 2022). A literacia em saúde, definida como a capacidade de aceder, compreender e aplicar informação em saúde, é essencial para a tomada de decisões informadas (Arriaga et al., 2022). Para ser efetiva, deve assentar em princípios de comunicação clara e acessível (OMS, 2024). No entanto, a falta de clareza em muitos materiais agrava as desigualdades, particularmente entre pessoas com baixa escolaridade (Arriaga et al., 2022). Surge assim o conceito de fluidez na informação em saúde, que enfatiza a necessidade de que a sociedade forneça informação precisa, clara e acessível, permitindo que os indivíduos a encontrem, compreendam e apliquem para tomar decisões informadas (Vaz de Almeida, 2024).

A comunicação clara e acessível implica transmitir informação em saúde de forma compreensível, estruturada e adequada ao público, superando barreiras de entendimento e promovendo o bem-estar (Vaz de Almeida, 2024). A clareza e a acessibilidade na comunicação e a utilização de ferramentas para a sua avaliação estão estreitamente interligadas (Greenhalgh et al., 2019). Requer também empatia e adaptação a diferentes níveis de compreensão, evitando a exclusão e promovendo a equidade (Kearns, 2021). Ferramentas de avaliação da comunicação clara e acessível, como o Clear Communication Index (CCI) (Baur & Prue, 2014), concentram-se em aspetos técnicos, mas não integram a perspetiva cidadã no seu desenvolvimento. Esta lacuna dificulta uma abordagem participativa e adaptada às necessidades reais do público. A CC apresenta-se como uma metodologia, fomentando a colaboração entre investigadores e cidadãos, demonstrando que estes modelos são mais relevantes e úteis do que os tradicionais (Silva et al., 2021). Contudo, a falta de ferramentas padronizadas limita a participação cidadã na investigação em saúde (Osmanlliu et al., 2022).

Neste contexto, torna-se necessária a elaboração de uma ferramenta através de uma abordagem colaborativa entre investigadores, profissionais de saúde e cidadãos, onde estes últimos desempenham um papel ativo desde o início e ocupam uma posição fundamental na avaliação da clareza e acessibilidade das comunicações científicas em saúde, antes de serem divulgadas de forma generalizada. Este envolvimento dos cidadãos garantirá a relevância e a acessibilidade do instrumento, fomentando um diálogo contínuo entre a comunidade e os investigadores e estabelecendo um modelo replicável em futuras iniciativas de investigação.

Assim, o objetivo deste projeto é a criação de um instrumento, específico para o contexto português, desenvolvido através de uma abordagem colaborativa entre investigadores, profissionais de saúde e cidadãos, com o intuito de medir a clareza e a acessibilidade das comunicações na área da saúde.

A participação cidadã na investigação científica, especialmente na área da saúde, tem vindo a crescer, destacando a necessidade de uma comunicação clara e acessível que facilite a literacia científica e em saúde e permita às pessoas tomar decisões informadas. No entanto, muitos materiais de saúde carecem de clareza, o que acentua as desigualdades, especialmente para pessoas com menor nível de escolaridade. A comunicação clara e acessível ajuda a superar estas barreiras, adaptando-se a diferentes níveis de compreensão, mas os instrumentos de avaliação atuais, como o Clear Communication Index (CCI), não integram a perspetiva cidadã, limitando o seu impacto. Para preencher esta lacuna, propõe-se um instrumento específico para Portugal, que será desenvolvido em colaboração entre investigadores, profissionais de saúde e cidadãos. Este novo instrumento permitirá avaliar a claridade e a acessibilidade da comunicação científica e melhorar a sua eficácia, promovendo assim a literacia e o empoderamento em saúde. Alinhado com os objetivos da UICISA: E, este projeto contribui para a Ciência Cidadã em saúde pública e para uma maior democratização do conhecimento científico em Portugal.

O objetivo geral deste projeto é a elaboração de um instrumento de medida da clareza e a acessibilidade das comunicações em saúde na perspetiva da Ciência Cidadã.

Objetivos específicos:

1. Identificar os conceitos-chave e as dimensões-chave relevantes para avaliar a comunicação clara e acessível em saúde. (TAREFA 1)

2. Construir um quadro preliminar do instrumento a partir das dimensões-chave. (TAREFA 1)

3. Refinar e validar as dimensões-chave e itens propostos através de consenso e realizar ajustes iniciais ao instrumento. (TAREFA 2)

*Um projeto subsequente que assegure a continuidade deste, para o qual será realizado um novo pedido à Comissão de Ética, consistirá em uma avaliação psicométrica da validade e fiabilidade do instrumento em várias fases: validade de conteúdo, estudo piloto, análise fatorial exploratória e estudo de validação final. Esta segunda parte, relativa à validação psicométrica, terá os seus objetivos e tarefas definidos a partir dos resultados da fase de elaboração do instrumento.

O presente projeto de desenvolvimento e validação de um instrumento inovador sobre comunicação clara em saúde para o contexto português representa uma contribuição significativa para a melhoria da literacia em saúde e científica para o fortalecimento da relação entre ciência e sociedade. Fornecerá uma ferramenta robusta e validada que permitirá avaliar e promover práticas de comunicação claras e acessíveis, beneficiando profissionais de saúde, investigadores e cidadãos. A abordagem inovadora assenta-se na integração da Ciência Cidadã, envolvendo os cidadãos em todas as fases da investigação. Através de metodologias participativas, os cidadãos assumem o papel de coinvestigadores, contribuindo para a construção de um instrumento adaptado às suas necessidades reais. Esta colaboração promove uma maior apropriação dos resultados pela comunidade e garante que as vozes dos cidadãos sejam ouvidas e consideradas no desenvolvimento de soluções para desafios na comunicação em saúde. Além disso, impulsiona a capacitação de investigadores e profissionais de saúde, oferecendo diretrizes claras para a implementação de práticas de comunicação eficazes. Os resultados esperados alinham-se com as com os Objetivos de Desenvolvimento Sustentável 2030, ao melhorar o acesso, a compreensão e a utilização de informações em saúde pela população. O impacto estender-se-á às comunidades, onde os cidadãos estão mais informados e capacitados para tomar decisões conscientes sobre a sua saúde. Adicionalmente, os recursos gerados, como um manual de procedimentos e protocolos de aplicação, garantirão a sustentabilidade do projeto e servirão de referência para futuras investigações.

Este projeto prevê a participação ativa de mínimo 5 cidadãos voluntários, envolvidos através das abordagens consultiva, colaborativa e de coprodução. Estes cidadãos serão recrutados a partir da bolsa de cidadãos da UICISA, e do seus contactos pessoais, recrutados a partir das ações do projeto de estudo associado inscrito na UICISA: E/ESEnfC “Ciência cidadã: do fazer ao comunicar ciência na ótica do cidadão”, tendo sido aprovado pela Comissão de Ética da UICISA: E, conforme Parecer P886_06_2022.

Em concreto, as etapas de Devellis e Streiner et al. propostas para a criação de instrumentos serão adaptadas aos princípios da Ciência Cidadã (Robinson et al., 2018), garantindo a participação ativa dos cidadãos em momentos estratégicos do processo. Especificamente, os cidadãos participarão:

● Da definição do constructo, oferecendo perceções baseadas em suas experiências e na relevância prática do tema.

● Contribuindo para a geração do conjunto inicial de itens, compartilhando suas perceções e experiências por meio de grupos focais e da técnica Delphi adaptada.

● Poderão opinar sobre o formato de medição do instrumento, garantindo que a linguagem e o formato sejam compreensíveis e acessíveis.

● Revisando os itens do instrumento como para fornecer uma perspetiva leiga essencial na validação dos itens propostos.

● Na identificação de itens adicionais que reflitam melhor suas perceções e necessidades.

  • Universidad de Almería
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    Project Information

    • Start Date

      24/06/2025

    • Completion date

      16/09/2025

    • Structuring project

      Citizen involvement in research processes and knowledge extension to society

    • Thematic line

      Education and development of the discipline

    • Target population
      • Profissionais da saúde, investigadores da saúde e cidadãos
    • Keywords
      • Comunicação e Divulgação Científica
      • Estudo de Validação
      • Inquéritos e Questionários
      • Participação Cidadã em Ciência e Tecnologia
      • Relações Comunidade-Instituição
    • Áreas prioritárias
      • Educação para a Saúde e Literacia
      • Formação e desenvolvimento dos profissionais de saúde
    • ODS da Agenda 2030 das Nações Unida
      • Garantir o acesso à saúde de qualidade e promover o bem-estar para todos, em todas as idades
    • Project Team
      • Iria Dobarrio Sanz RI
      • Fernanda Moura Lanza
      • Rosa Carla Gomes da Silva
      • Filipa Isabel Quaresma Santos Ventura
      • José Manuel Hernández-Padilla
      • Margareth Cristina de Almeida Gomes
      • Filipa Daniela de Oliveira Custódio e Figueiredo Lopes
      • Filipe Manuel Paiva dos Santos
      • Tânia de Fátima Simões Rodrigues
      • Maria Clara Ferreira G Lopes
      • João Manuel Ferreira da Silva
      • Cristina Maria Figueira Veríssimo
      • Silvia Manuela Dias Tavares da Silva
      • Elaine dos Santos Santana
      • Maria da Conceição Gonçalves Marques Alegre de Sá